Casta Diva: Callas e a pulsão de morte

Poucas cantoras de ópera foram mais dedicadas, mais aplicadas, mais profissionais do que Callas (...) O resultado dessa total concentração no seu ofício, dessa dedicação sempre no limite das suas possibilidades explica, talvez, porque uma cantora com uma voz tão desigual, tão cheia de defeitos (para os críticos mais tradicionais), pôde atingir uma posição tão alta no Olimpo das divas do seu tempo. Pois Callas, de fato, se transfigurava inteiramente não só no nível da encarnação do personagem, no plano teatral, mas também no nível da voz em função da ópera que fosse cantar. A voz de Norma não era absolutamente a mesma de Cio-Cio-San, que também não era a de Lucia de Lammermopor, ou a de Medea: sua emissão vocal podia se tornar mais densa, terrena, sombria, capaz de exprimir afetos como ódio, escárnio (interpretando Lady Macbeth ou Medea, por exemplo) ou ficar mais fluida, etérea, clara, capaz de compor uma inocência adolescente (como a de Cio-Cio-San) ou de exalar a jovialidade (como Amina, em La Sonnanbula)