A metáfora já foi compreendida como o verdadeiro fundamento do conhecimento, assim como o seu emprego, em certas ocasiões, caracterizado como especialmente relevante para as reflexões teóricas. Esse parece ser o caso de saberes como os da historiografia, que dependem da narrativa para a constituição dos vestígios de experiências passadas em objetos de investigação. Este livro adota a metáfora em sua interrogação central: o historiador poderia ser compreendido como uma espécie de fotógrafo da morte? Por meio dessa figuração do historiador como fotógrafo, tensionado entre o risco de esquecer de morrer como banalização da vida e de habituar-se a morrer como banalização do mal, propõe-se um questionamento das práticas historiográficas. Colocado no lugar daquele que também produz imagens do passado, o historiador é instigado ao abandono de interpretações redentoras, que restauram o sujeito ou o sentido da existência, apagando fissuras e cisões que ameaçam certa idealização do humano. Abre-se caminho, então, para pensar a escrita da história em sua potência fabricadora de imagens que perseguem, fazem pensar ou, como diria Georges Didi-Huberman, fazem arregalarem-se nossos olhos de crianças.
Para dar forma heurística ao uso da metáfora, cinco filmes são examinados: Histórias que só existem quando lembradas (2011), dirigido por Júlia Murat, que tematiza o fechamento do cemitério na cidade imaginária de Jotuomba; O sal da terra (2014), documentário em homenagem a Sebastião Salgado e que tem igualmente um fotógrafo como protagonista; a trilogia de Roy Andersson, composta por Canções do segundo andar (2000)¸ Vocês, os vivos (2007) e Um pombo pousou num galho refletindo sobre a existência (2014).
Nesse último caso, a câmera filmadora aproxima-se da técnica fotográfica, permitindo que a comparação se estenda do historiador e do fotógrafo também para o cineasta, ao mesmo tempo em que o questionamento sobre o que significa ser um ser humano traz consigo problemas fundamentais sobre a morte e o (sem) sentido da existência.