Se o belíssimo poema de abertura deste livro já não nos convidasse ao necessário horizonte da suspeita (“Devia ter suspeitado, / pelo jeito que atravessava ruas / como quem se arremessa de um parapeito”), seríamos tentados a completar seu título interrompido (Mais ridículos que) com as pessoanas cartas de amor ridículas, o que sugeriria talvez um livro de amor endereçado; ou, seguindo a sinalização da epígrafe de Wislawa Szymborska, que afirma que ao ridículo de não escrever poemas se deve preferir o ridículo de escrevê-los, talvez imaginássemos adentrar um livro de irônica investigação do acontecimento e mesmo do não acontecimento (sim, porque quem alguma vez esteve minimamente vivo na vida sabe que ao passeio com o cachorro que tivemos justapõe-se sempre o passeio com o cachorro que nunca tivemos). Ocorre que toda boa suspeita também suspeita de si mesma, e arrisco afirmar então que Thomaz Pereira, em seu poderoso livro de estreia, fez isso mesmo: investigou os possíveis (ridículos ou não) do amor e do fazer (“fazendo fazemo-nos / façamos”). Alguém já disse que o poeta é “esse morcego cego que só pode voar graças à decifração de seu próprio grito rebatido nas coisas”. E para Thomaz, que imagina um antinarcísico mundo sem espelhos, onde seríamos mais pés que rostos, menos se deve contemplar alguma coisa do que quase esborrachar-se contra ela (por isso amar é calçada quebrada onde ralar os joelhos), forma de conhecimento do mundo que de fato corresponde a atravessar as ruas como quem se arremessa de um parapeito. Ean: 9786559056590