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De repente aquele menino que já foi tão engraçadinho e afável sai do quarto com a mesma roupa que está usando há dois dias e seu diálogo resume-se a uma frase: "Tô morrendo de fome, o que tem pra comer?". É quando os pais notam o quanto ele está alto, um tanto desengonçado, com pernas e braços que parecem grandes além da conta...
Ou então é ela, a princesinha da casa, que vive entocada ouvindo centenas de vezes a mesma música, pendurada no telefone ou observando detalhadamente cada milímetro de seu corpo, que sofre mudanças tão velozes quanto seu humor.
É uma época difícil para a família? Pois pode ser ainda mais difícil para os garotos e as garotas. Para ajudar pais e profissionais da adolescência (professores, educadores, terapeutas), o psiquiatra francês Stéphane Clerget, especialista no atendimento de adolescentes (e de adultos que localizavam grande parte de suas angústias na adolescência mal resolvida), escreveu Adolescência: a Crise Necessária.
Foi para ajudar a família a diferenciar o que, de fato, é um problema real, que surge e se amplifica nessa fase da vida, dos fenômenos que fazem parte da evolução em direção à idade adulta, que Clerget produziu a obra. Sua proposta é separar o que faz parte da crise da adolescência comum e o que representa sofrimento, impasse na evolução ou risco vital.
"O que é mais espetacular e desconcertante para os adultos não é necessariamente o mais grave", ensina ele. Clerget reafirma que "não existe adolescência normal sem perturbações." Porém, alerta o especialista, é preciso estar atento às manifestações desse período, pois "a questão da depressão está no cerne da adolescência". Praticamente todos os adolescentes têm momentos de depressão, mas não são todos os que irão apresentar um franco estado depressivo. "A explicação para isso é que o processo da puberdade e o processo depressivo têm muito em comum. O tédio, a perda da auto-estima, a vergonha, a introversão, a morosidade, a inércia são sintomas típicos da depressão e ilustram desde sempre estados d´alma ou as maneiras de ser dos adolescentes."
Essa passagem obrigatória, a crise necessária para se tornar adulto, é uma longa cerimônia de adeus. Adeus ao corpo de criança, aos amiguinhos, à imagem dos pais. Os que tiveram uma infância harmoniosa estão mais aparelhados para enfrentá-la sem maiores turbulências.
Clerget afirma também que a juventude é o novo credo da nossa sociedade e que essa atitude é danosa para os adolescentes. "O atual ‘juvenismo’ dos adultos, que se vestem ‘jovem’, falam ‘jovem’ e se mantêm ‘jovens’' ao custo de importantes esforços, faz com que os códigos e os ícones da juventude sejam incorporados por todos. Os verdadeiros jovens não param de reagir contra esta aproximação inconveniente. A velocidade das que caracterizam esses últimos 20 anos é o reflexo dessa necessidade de se diferenciar."
Essa busca de diferenciação incessante, que conduz a juventude atual, por exemplo, a usar roupas extremamente largas, que não marquem o corpo, e a necessidade de lutar contra o corpo que muda e no qual o adolescente não mais se reconhece, explicam também a disseminação das tatuagens e dos piercings, de acordo com Clerget.
O psiquiatra dedica um capítulo de 20 páginas a uma questão que incomoda cada vez mais pais, profissionais da adolescência e autoridades policiais em todo o mundo: a violência entre os adolescentes e praticadas por eles. "Em todos os discursos sobre adolescentes, a violência ocupa um lugar central. Ela é individual ou realizada em grupo. Tem causas comuns a todas as idades e outras próprias à adolescência. Não é específica do adolescente, mas é descrita em todos os casos desde a Antiguidade como uma disposição particular a este período da vida", explica o especialista.
Entre as causas sociológicas do aumento da violência entre os jovens, estão a crise econômica e o desemprego . "O desemprego dos pais, em particular dos provedores da família, ocupa um lugar especial. Os meninos têm uma imagem paterna desvalorizada, que é agravada se ainda se acrescenta um divórcio, uma patologia (alcoolismo) ou uma dificuldade de inserção social", assinala o autor.
O psiquiatra lista os motivos que podem levar ao ato extremo, como as razões pessoais e de família, e dá conselhos aos pais. Um dos relatos é o da adolescente Greta (nome fictício). Ela conta que sofreu com uma mãe fria e autoritária. "À espera da afeição, ela se submeteu à mãe até sua morte. Então Greta aceita a idéia de ser ela mesma mãe. Nasce uma filha: Anne-Sophie. Greta promete não lhe dar a mesma educação que recebeu e que a fez sofrer. Ela a cobre de amor ao ponto de sufocá-la, não lhe recusa nada, não a deixa jamais e prevê todos os seus desejos. A morte de seu marido só faz reforçar essa conduta. Mas, quando a adolescência chega, como desalojar-se deste paraíso? Como imaginar poder viver fora dele? Como encarar o inferno de uma vida autônoma? Como deixar sozinha uma mãe que somente se sente satisfeita neste lugar? A tentativa de suicídio é então, para Anne-Sophie, o único separador que ela pôde encontrar."
Clerget toca noutra questão fundamental para os pais que se sentem distanciados de seus filhos pelas demandas do dia a dia: a dificuldade de impor limites. Trata-se de um verdadeiro manual para quem quer ajudar seus filhos a atravessar esse difícil período da vida, não com a pretensão de ter todas as respostas, mas sim com o desejo de estar preparado para discutir com franqueza com essas quase-crianças e quase-adultos, tendo a oportunidade de confrontar as situações atuais com as que outros pais já viveram.